domingo, 4 de julho de 2010

Tertúlia - Quando foi a última vez que fizeste alguma coisa pela primeira vez?









Quando foi a última vez que fizeste alguma coisa pela primeira vez? foi o tema da primeira tertúlia organizada por Yannick Micard Teixeira e a LEME A.i.s.c., com dois convidados tão bem conhecidos das gentes ovarenses, Rafael Polónia e Tanya Ruivo, os dois “gestores de projectos” que percorreram 12000Km em 9 meses por toda a Europa.

Esta tertúlia serviu essencialmente para melhor conhecer a viagem destes dois aventureiros. Quais os medos, os problemas, como é que se parte para uma viagem destas, o que podemos aprender com estas aventuras. Tudo foi sendo descortinado ao longo de quase 3h de conversa.

A tertúlia começou com uma apresentação composta por várias fotografias, vídeos e alguns textos.

Mal termina a apresentação surge de um dos presentes um “Está giríssimo pá. Isto fez-me sentir 30 anos mais novo e relembrar quando pus a mochila às costas e fiz um Inter-Rail”.

“Só a pessoa que arrisca é livre”. Esta frase é uma das tantas presentes na apresentação e que tão bem define estes dois jovens. Rafael chega mesmo a dizer que “o mais difícil não é o primeiro passo, mas sim o segundo. O primeiro é quando nós dizemos que vamos fazer uma viagem. Mas o segundo, quando chegamos à beira do nosso patrão e dizemos que nos vamos despedir para fazer uma viagem, aí sim é complicado, não há retorno e aí começa a grande viagem”.

Rafael explica o porquê do uso da bicicleta. Além de ser um meio de transporte ecológico, permitiu-lhes viajar e apreciar as coisas de uma forma que de carro ou comboio seria impossível. Tanya fala da subida de uma montanha, talvez das mais duras, mas que ao chegar ao fim, vislumbram o mar Adriático e choram, gritam. É a recompensa de uma subida extenuante. Maior parte das pessoas que o viram não o conseguiram apreciar da mesma forma, pois não houve o esforço de pedalar todos aqueles quilómetros.

Esta viagem contou com inúmeras peripécias e com um incessante travar de conhecimentos. Rafael disse inclusive várias vezes que quando lhe perguntavam quais as cidades que mais tinham gostado, a resposta centrava-se nas cidades onde tinham gostado mais das pessoas.

Há novamente um comentário vindo do público, “Aprendemos muito mais com as gentes do que com os lugares”.

Rafael pertence há cinco anos ao “Couch Surfing”, o que lhes permitiu alguns contactos para esta viagem. Uma ocasião, à chegada a Wroclaw, na Polónia, e contanto com uma morada que lhes tinha sido dada por um dos “surfer’s”, perguntaram a um ciclista que passava na rua onde era a tal morada e ele lá lhes indicou. Trocaram os contactos e subiram. Entretanto começa a chover torrencialmente e ninguém lhes abre a porta. Entretanto, Radek, o ciclista que tinham conhecido do nada, liga-lhes a perguntar se estava tudo bem e se precisavam de algo… E precisavam, estavam sem casa para ficar e com uma tempestade lá fora. O tal ciclista não tem mais nada e pega numa carrinha e vai busca-los para casa dele. Acabaram por lá ficar quatro noites. Como disse uma das pessoas que participava na tertúlia, “o contacto imediato com as pessoas é muito mais forte e intenso”.

Uma das conclusões que tiramos desta tertúlia é que ao contrário do que possamos pensar, este tipo de aventuras é bem mais fácil do que parece. Talvez devido à formatação mediática a que somos sujeitos temos uma ideia errada das pessoas e culturas que não a nossa. Um exemplo dado por Tanya foi a cultura islâmica, que achamos que é uma coisa terrível mas não o é. E não se pense que é só no resto do mundo que as pessoas acolhem desconhecidos. Rafael conta uma história de um grupo de quinze ciclistas que passavam por Portugal e que ao chegar ao Alentejo são interpelados por um senhor que não hesitou em dar-lhes abrigo, aos quinze.

Uma outra peripécia foi a de, depois de um dia em que tudo corre mal, chuva, frio, comida que Tanya foi incapaz de cozinhar de tão mal cheirosa que era, enfim, como os próprios diziam: “um dia terrível”. Aproxima-se um homem, que nem uma palavra em Inglês sabia dizer, mandou-os “empacotar” a tenda e levou-os para uma casa onde puderam pernoitar, tomar um banho e relaxar. Mais uma prova de que quando tudo corre mal, há sempre uma ponta de esperança em que tudo pode melhorar.

Depois de algum tempo de conversa, eis que surge talvez a pergunta que toda a gente faz.

E custos? A resposta é simples e vem por parte de Rafael. “Quanto é que gastas por dia? 5€? Pois bem, retira a esses 5€, 3€ de tabaco, aquele fino que bebes-te ali e o café que vais beber daqui a pouco. Pois é, tirando as banalidades acabas por conseguir poupar imenso e é isso que fazemos. O facto de sermos vegetarianos também nos permite poupar algum dinheiro e se saio com os meus amigos e eles bebem 5 finos, eu bebo um Sumol de laranja. Tudo parte de um objectivo por ti traçado. Só para teres uma ideia conseguimos fazer médias de 22€/dia para os dois. Na Turquia chegámos a fazer médias de 15€/dia. Tudo consiste numa boa gestão de gastos. Daí dizerem que nós não somos ciclistas mas “Gestores de Projectos”. Gerimos o caminho a seguir, despesas a ter, etc. Digamos que é uma boa forma de acrescentar estas viagens ao Currículo”.

Umas das coisas essenciais para este tipo de aventuras é, e segundo as palavras de Rafael, “ser lateiro”. “ A determinada altura não tínhamos onde ficar. O Rafael fez um choradinho ao Sr. do hotel para baixar o preço e quando damos por nós estamos a dormir num hotel de quatro estrelas com direito a chinelos de quarto e tudo” completa Tanya.

A palavra coragem veio várias vezes à baila, e não há dúvida que este casal tem-na para dar e vender, mas como disse Rafael, para ele há coisas que para as quais e necessária muito mais coragem. Para ele é um acto de maior coragem ter, por exemplo, um filho do que pegar nas bicicletas e viajar.

Rafael e Tanya gostariam de levar este tipo de “palestras” às escolas para que os miúdos saibam na primeira pessoa como é. “Sempre me falavam que o João Garcia tinha escalado o Everest mas não foi ele que mo disse, gostava de o ter à minha frente a contar todas as histórias para que as possa viver mais intensamente” desabafa Rafael.

O que mais marca este tipo de viagens é o “confronto” de culturas. O que para nós é normal para outro povo é surreal. Rafael conta que na Índia o mais normal é todo o lixo ser largado em qualquer lado. “A certa altura estava a comer batatas fritas e terminei, amachuquei o pacote e guardei-o na mochila. Chamaram-me porco”.

Não é possível dizer qual a cultura mais certa ou a mais errada. Possível é aprender e respeitar.

Há outro elemento da plateia que lança a pergunta: “Ser português ajuda?”. “Sem dúvida. O facto de ser português, ser “amigo” do CR9, andar de bicicleta, tudo isto são factores que nos ajudam quando interpelamos as pessoas. Tornasse tudo mais fácil” diz Rafael.

Além de toda uma viagem que foi contada ficamos a saber da “Eurásia”. A viagem que este casal vai fazer de estremo a estremo. Partem de Ovar e contam chegar até Macau, sem mais planos. Como disse Tanya “o que mais gosto é de partir sem saber o que vai acontecer”.

E já para não perder o ritmo partem hoje, dia 05 de Julho para o Algarve para quinze dias de férias. Na bagagem levam postais feitos por eles de locais por onde passaram, t-shirts oficiais da viagem, etc.

Esperando que tudo corra pelo melhor a estes dois aventureiros, fica o endereço do blog onde se pode encontrar toda a informação relativa às suas viagens.


http://2numundosobrerodas.blogspot.com/


Texto e Fotos: Daniel Mendonça | LEME A.i.s.c.



2 comentários:

  1. Obrigado por isto! Já não é a primeira vez que por uma razão ou por outra não posso estar presente, e nenhuma resposta à pergunta "Então e como é que correu?" seria tão esclarecedora como isto. Continua o bom trabalho, tenho seguido sempre os teus cantinhos ;) Beijinho grande e parabéns

    ResponderEliminar